TÍTULO: LIVROS DE MÚSICA PARA O PÚBLICO
INFANTOJUVENIL.
AUTORA: DANIELA DEL SOLE.
RESUMO
O
artigo “Livros de música para o público infantojuvenil” têm como objetivo
analisar três obras de autoras brasileiras acerca de importantes personagens da
música: Mozart, Villa-Lobos, Cartola e Chiquinha Gonzaga. A metodologia
envolveu a revisão bibliográfica, com leitura e análise das respectivas obras à
luz do lexto de Madalena Klein “Literatura infantil e produção de sentidos
sobre as diferenças: práticas discursivas nas histórias infantis e nos espaços
escolares”.
Os
resultados dessas análises apontam para a pesquisa contínua, além da
desnaturalização do olhar, sobretudo quando os assuntos são mais polêmicos,
envolvendo desigualdades sociais, de gênero ou étnicas, além de discriminações
aos deficientes físicos.
Palavras-chave:
Música, infantojuvenil, literatura, discurso.
INTRODUÇÃO
A
possibilidade de diálogo entre o texto "Literatura infantil e produção de
sentidos sobre as diferenças: práticas discursivas nas histórias infantis e nos
espaços escolares", de Madalena Klein e as obras: "Cadê a peruca do
Mozart" (Sylvia Orthof); "Villa - Lobos" (Nereide S. Santa Rosa
e Ângelo); "Cartola" (Edinha Diniz) e Chiquinha Gonzaga (Edinha
Diniz), decorre do comprometimento de Klein em analisar o discurso contido
nessas obras da literatura infantil, como artefatos culturais.
Nos Estudos Culturais, área de
estudos iniciada por Stuart Hall, Thompson e, no Brasil, por Maria Elisa
Cevasco, as análises que estão voltadas para a educação residem na
possibilidade de analisar algumas obras da literatura infantil, do ponto de
vista da tolerância e aceitação em relação ao diferente.
Assim, a literatura infantil é
compreendida como "artefato cultural presente em diferentes contextos
sociais, sendo a escola um espaço privilegiado para a leitura desses
materiais." (Klein, p.3)
É curioso pensar que as próprias
editoras façam uma seleção das temáticas, como deficiência, aceitação,
diferenças sociais e raciais, orientação sexual, ética e cidadania. Por meio da
análise sobre como o "diferente" é visto nas obras, pode-se
compreender e problematizar efeitos que venham a reproduzir a naturalização do
olhar. Assim, olhar analiticamente para o modo como o diferente tem sido
tratado requer uma percepção aguçada para desmistificar muitos dos preconceitos
que ainda estejam implícitos às obras.
CONTEÚDO
1) ORTHOF,
Sylvia. Cadê a peruca do Mozart.
Editora Paulinas, 1998.
Mozart é o protagonista do livro
"Cadê a peruca de Mozart", em que a temática das diferenças não é
abordada diretamente, embora a história da autora - Sylvia Orthof (1932-1997)
trouxesse uma relevância para a compreensão de uma realidade mais complexa, na qual
era filha de imigrantes pobres, aprendeu o alemão antes mesmo do português e
manteve o sotaque na idade escolar. Sua trajetória como escritora é destacada
por uma escrita irreverente, em que tal diferença não é compreendida como se
ela fosse vítima, heroína ou vilã.
Ao se tornar escritora, as
representações aparecem em uma história descompromissada dos fatos reais - a de
Mozart, interligada à sua própria, caracterizada por uma possível
invisibilidade da autora, que escreveu mais de 100 livros para jovens.
Suas premiações não soam como mera
oportunidade aos excluídos, mas sobretudo como dados biográficos que apontam
para a diversão e surpresa, o que pode atender às expectativas desse público
específico.
Quanto ao olhar de algum estudante
diante dessa obra, imagina-se que ele não se veja em tal história,
primeiramente pela distância cultural. Porém, a identificação pode ocorrer por
outra via, ou seja, pelo uso que a autora faz do humor, da poesia e da
irreverência.
"A literatura infantil
inscreve-se nesse circuito, onde representações sobre o outro/ diferente
produzem identidades e diferenças e, um complexo jogo de produção, consumo e
regulação de significados." (Klein, p. 5) Ou seja, não temos a dimensão
acerca dos caminhos que a obra possa atingir. Às vezes, o fato da história do
compositor parecer distante da realidade maioria da população, pode resultar em
curiosidade, buscas e até significados, dos quais não teríamos como imaginar
seus resultados no imaginário infantil.
2) ROSA,
Nereide S. Santa Rosa e BONITO, Angelo. Villa-Lobos,
1994.
Villa - Lobos é um livro que
demonstra como as mudanças de Estado permitiram ao personagem principal
possibilidades de experimentação em estilos musicais variados, despertando seu
interesse pela música.
Nesse caso, a autora narra a
história do protagonista como se uma ação levasse à outra, ou seja, Villa foi
dando visibilidade e dizibilidade à sua obra, conforme as experiências que
vivenciava.
Tratar da figura do caipira
representa mexer com a controvérsia rural X moderno no Brasil, o que deu à
Villa - Lobos o título de músico erudito que soube ser popular. Ora, o rural e
a figura do caipira pode ser associado à imagem do Jeca, aquele que mal fala,
não entende a língua escrita e, portanto, não narra sua história por si mesmo,
a não ser que seja por meio da canção, também vista como simples, pouco
elaborada/sofisticada. Tanto é que para que tal raiz fosse aceita entre músicos
eruditos, foi preciso que uma nova roupagem atingisse sua obra. Uma questão
interessante seria verificar como o caipira se vê na obra de Villa Lobos.
Assim, o papel do educador, se adotasse essa obra, seria incorporar à obra do
personagem principal, outras maneiras de expressar, procurando desmistificar a
ideia do caipira como ingênuo demais (vítima), como herói e mesmo como vilão. A
própria escuta da obra pode gerar a percepção dos alunos.
Porém, "o texto escapa,
possibilitando múltiplas leituras: [...] não existe um significado fixo único
e, consequentemente nunca poderá existir uma leitura fixa, baseada na noção de
um conjunto de posições ideais-típicas." (Hall, 2003, p. 370) Sendo assim,
por mais que a obra venha a induzir o leitor, como num convite, a percorrer
pela obra, haverá sempre significados que escaparão à nossa percepção, devido
ao fato da percepção ser única e, conforme a história de cada um.
3) DINIZ,
Edinha. Cartola. Callis Editora,
2000.
O livro sobre a biografia de Cartola
foi escrito por Edinha Diniz, responsável por inúmeras outras obras
biográficas. A própria autora afirma que não publica histórias de vida, mas
ensaios sócio-históricos.
A vida de Cartola, em si, já é um
exemplo de como abordar o diferente, por sua etnia e condição sócio- econômica.
A maneira como a autora tratou na obra pode estimular as crianças de uma mesma
condição a despertarem o interesse pela música.
A responsabilidade do professor é
enorme, ao exaltar a relação de Cartola com o pai, a sua esperteza e o vínculo
afetivo da criança com o instrumento musical.
"A mensagem é uma estrutura
complexa de significados que não é tão simples como se pensa. A recepção não é
algo aberto e perfeitamente transparente, que acontece na outra ponta da cadeia
de comunicação. E a cadeia comunicativa não opera de forma unilinear."
(Klein, p.6) Sendo assim, para cada leitor e ouvinte de Cartola, embora a
questão da exclusão esteja latente, haverá muito do que ultrapassa tais
condições, no entender de cada um, imbricada em sua poética e narrativa, o que,
certamente, gerará um trabalho bastante complexo e interessante.
4) DINIZ,
Edinha. Chiquinha Gonzaga. Callis
Editora, 2000.
O
livro sobre Chiquinha Gonzaga perpassa por questões de gênero de uma
compositora, pianista e maestrina de grande importância no cenário da música
brasileira.
Sua história não é tida como a de
uma heroína em si, mas muitas meninas podem se identificar com sua garra, como
ocorreu durante a exibição do seriado sobre essa personalidade.
A obra tem uma relevância importante
por se tratar de uma personalidade excluída que ganha visibilidade e dizibilidade
devido à sua obra, por seu vínculo com a família e com a música.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O
professor, ao invés de tentar apenas agregar o diferente, deve criar momentos
de reflexão diante do que é tido como tal. Ou seja, será que quem é
discriminado é que deve se adaptar, ou será que a diferença pode ser utilizada
como forma de ampliar as estratégias de aprendizagem?
Por exemplo, um aluno cego pode
estimular o professor a desenvolver materiais pedagógicos, que não só facilitem
o trabalho com esse aluno, mas para todos que tenham percepção auditiva melhor
que a visual. Incluir, nessa vertente, seria encarar a literatura, não um artefato
pronto e acabado, mas um instrumento que representa tempos e momentos, podendo
ser transformado conforme "lutas" que resultam em revisões contínuas,
pois as negociações em jogos de poder estão em um campo simbólico e as
identidades constroem-se a partir das diferenças.
"As representações constituem
campos de lutas nos quais os significados são negociados, construídos,
impostos; elas estão envolvidas em jogos de poder e seus efeitos estão
implicados na produção de identidades e diferenças." (Klein, Madalena, p.
5)
Assim, a diferença / diversidade é
característica da nossa espécie. Portanto, o modo como gesticulamos,
conversamos, cantamos, andamos, independentemente de deficiências físicas,
variam infinitamente, pois muito além das diferenças físicas, estão as
diferenças culturais.
Ao professor, cabe ensinar ao
estudante o respeito a essa pluralidade cultural, ao mesmo tempo em que, ao dar
voz a quem não dizia, ao longo da história, contribui para a democracia e principalmente
para a ampliação do universo cultural dos estudantes, ao explorar repertórios
variados.
Na busca da tolerância, também deve
vislumbrar que as possibilidades de interpretação das leituras são múltiplas.
Daí, o cuidado com o material a ser escolhido, pois dentre as diversas maneiras
dele chegar ao aluno, devemos evitar interpretações que reforcem a naturalização das construções
sociais.
BIBLIOGRAFIA
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